25.2.08

Vida.. Humanos..

Comboio.
S.João -> Paço d'Arcos.

. Um jovem casal estrangeiro. O rapaz é bonito, tem um piercing na orelha esquerda. Ela olha pela janela e vai apontando com o dedo e falando entusiasticamente com ele. Portugal tem zonas bonitas? Eles estão a gostar da viagem. Que futuro terão estes dois jovens?..

. Duas irmãs pretas que na estação compraram um bilhete e meio. A mais velha: "era um bilhete mais um bilhete meio. Um bilhete e meio. É um bilhete de Oeiras para o Cais do Sodré e mais um meio de Oeiras para o Cais do Sodré". Seria tão simples: "por favor, são dois bilhetes Oeiras - Cais do Sodré, um inteiro e o outro meio"; ou ainda: "um bilhete e meio de Oeiras ao Cais do Sodré, sff". Agora, no comboio, a mais velha (do lado da janela) ouve música nos headphones pelo tlm e olha para ele de vez em quando talvez porque espera uma msg. A mais nova brinca com um daqueles brinquedos de alta tecnologia do tipo gameboy (acho que é aquele jogo em que temos que cuidar e domesticar um cão.. a minha prima tem um.. é capaz de ser.. sim, tem todo o aspecto disso).

. A rapariga, perdão, mulher moderna que lê uma revista. Um revista igualmente moderna. Uma Time Out ou uma Psicologia Actual. Bem vestida. Ou super fashion bem vestida. Bonita. Ou a bonita da beleza moderna.

. O homem-do-gameboy-mala-bombista. Entra no comboio com uma certa agitação. Senta-se também agitado e com alguma agitação permance. Agitado e agitação em todo o lado. Outra raça. Talibã. Preconceito. Mesmo no banco em frente ao meu (na linha de Cascais os bancos e consequentemente as pessoas não estão viradas umas para as outras) começa a abrir uma mala - daquelas que aparentam o "tipo reunião" mas são antes do "tipo bomba" - e eu faço todo o filme: homem estranho-bomba - ameaça de explosão - alguém tenta persuadi-lo - mas porque não a detonou ainda? - espera pelo Cais do Sodré onde há muito mais gente - eu sou a pessoa mais próxima - serei partículas mínimas no meio de pó e destroços - uma coisa qualquer cor-de-rosa que uma vez vi explicarem na anatomia de grey - pára de pensar merda Catarina - tens uma imaginação do caraças e os teus filmes disparam ao mínimo estímulo. De repente, ouço uns barulhinhos engraçados e irritantes ao mesmo tempo. Ele está a jogar gameboy. Toda aquela movimentação dentro da "mala do tipo bomba" era para sacar do brinquedo. Mas (há sempre um Mas), ele continua nervoso e olha para toda a gente. Agora já não me parece um possível bombista mas um estranho-nervoso-possível maluco. Está a falar sozinho. Confirma-se: é estranho-nervoso-possível maluco. Espera, então também eu e mais meio mundo o é. O filme já vai longe e ele parece desmaiar. Inclina a cabeça para baixo duma maneira tonta. Já não se ouve o gameboy. Não há desmaio. Não acontece nada. É uma pessoa aparentemente normal.

. Mulher ao fundo que parece querer dizer-me algo com o olhar. Amo-te?. Os nossos olhares continuam a trocar-se. Mais um pouco. Agroa dorme ou descansa com a cabeça encostada no vidro.

. Uma rapariga mulata, cabelo afrostyle encaracolado que parece querer picar-se com o pica. Mas um picanço mais numa de enfrentá-lo, como se ele tivesse tido algum comportamento mau do tipo preconceituoso ou de assédio. Olha-o para enfrentá-lo. Parece que quer que ele faça alguma coisa(basta um olhar do tal preconceito ou assédio) para que ela possa enfrentá-lo. Ela está mais do que preparada para se defender. Mas, é ela que está a atacar para depois se denfender. É aquele tipo de situação em que desejamos que o outro nos faça algo "minimamente mau" (ou que assim o possamos considerar), para podermos despejar e canalizar tudo o que temos cá dentro.

. Pica com ar muito estranho, chateado e olha para mim. Acha que é um olhar de flirt e começa ele num olhar flirtuoso. No entanto, continua aborrecido com algo.

. Cigana. Uma mulher cigana. O ser mais impressionante desta viagem. Na estação: caíram as moedas no chão. Muito aflita. "um bilhete de ida e volta, pelo amor de deus". (o comboio a chegar, rápido!). Deixa cair novamente as moedas, agora dentro do comboio. Muito exaltada, aflita por meio cêntimo representar a vida. Vai junto à janela. Chora. Desespero. Passa-me pela cabeça que vai a Lisboa para reconhecer o corpo de um familiar. Não, é um choro de mágoa e tristeza profundas, dor e desespero (provavelmente da vida). Observo cada ruga da sua cara e o seu olhar.

Não quero sair do comboio. Que vida! que fotografia e imensidão humana que está ali presente naquele compartimento do comboio.
E as pessoas que não mencionei?
E as outras carruagens?
Tenho que sair.
Saio.
Fico prostrada a olhar para eles - sim, conheço-os - enquanto se vão embora. Digo um adeus para mim. Apetece-me acenar como se de facto tivessemos trocado informação sobre as nossas vidas e fossemos fiéis conhecedores da pessoa de cada um.
E agora? Não há mais vida para ver e observar.
Não, há sim.

. Um mendigo/um bêbedo, sentado na estação. Cabisbaixo com os cotovelos apoiados nos joelhos. A garrafa de vinho tinto em pé, vazia ao lado. Parece que lhe faz companhia como se dum ser humano se tratasse.

. E mais à frente,..

Enfim, a vida continua..

4 comentários:

Houston disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Houston disse...

I wish I was like you
Easily amused
Find my nest of salt
Everything is my fault
I'll take all the blame
Aqua seafoam shame
Sunburn with freezer burn
Choking on the ashes of her enemy

Jonnas disse...

Bonito este épico... lol. A consola n se xama gameboy. Chama-se Nintendo Ds e o puto ia a jogar nintendogs. Lembra-te disso... Vai-te ser util para a vida... ou não... ou não...

Houston disse...

epá! ainda n visitaste o meu blogue!